Um dos temas mais discutidos atualmente na área da saúde é o polêmico uso da Cannabis sativa medicinal (conhecida popularmente como "maconha") para o tratamento de doenças – assunto que, inclusive, será tema de uma palestra no nosso 18º Encontro Nacional de Biomedicina. As potenciais aplicações dos canabidióis são diversas: efeitos anestésicos, efeitos no tratamento do glaucoma, Alzheimer, epilepsia, efeitos supressores tumorais, entre muitos outros. A questão da utilização de canabidióis, porém, sofre muito com o preconceito que a utilização da própria cannabis sofre e, assim, encontra resistência em diversos setores da sociedade. Um dos motivos para isso é a incidência de efeitos adversos ocasionada pelo THC, que envolvem ânsia, alucinações, perda de memória, julgamento prejudicado e até dependência – ou seja, efeitos similares à utilização recreacional da cannabis.
Felizmente, estes efeitos colaterais podem estar com os dias contados. Uma equipe de pesquisadores de diversas universidades européias descobriu que os efeitos adversos estavam ligados a uma vida de sinalização neuronal totalmente separada da via utilizada para gerar os efeitos terapêuticos. Especificamente falando, o culpado é o receptor 5HT2AR, um receptor da via da serotonina. Utilizando ratos sem 5HT2AR, os cientistas notaram uma redução ou ausência dos efeitos colaterais comportamentais e de memória, mas sem afetar os efeitos benéficos. Isso se deve à interação de receptores 5HT2AR com receptores CB1, os receptores cerebrais de canabidióis. Os dois receptores formam heterômeros com sua ativação, e estes heterômeros possuem atividade cerebral, causando a mudança da proteína G acoplada aos mesmos – de Gq para Gi. A proteína Gi tem efeitos inibitórios sobre a sinalização celular, o que explicaria a perda de memória e dificuldades cognitivas.
Assim, a inibição destes receptores apresenta-se como um possível mecanismo para reduzir os efeitos adversos do uso do THC. Ainda é necessário realizar testes clínicos para verificar a eficácia desta inibição em humanos, mas a perspectiva é muito positiva e, se concretizada, irá ajudar a viabilizar a utilização de análogos da cannabis como alternativa de tratamento para diversas doenças, superando os preconceitos envolvidos com a molécula. Estamos na torcida!
Fonte: Encontro Nacional de Biomedicina